terça-feira, 11 de setembro de 2007

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COMO SERIA SE.... um espaço qualquer, dois sujeitos se dividem em seu próprio refúgio, criando frestas para expor algumas de suas intimidades. Como seria se... na presença de conflitos, eles se divergissem em determinado momento e em outros se cruzassem de uma forma singular. Como seria se... os sujeitos se multiplicassem se... o olhar de estranhamento daquele que observa criasse associações possíveis de modificar o ambiente proposto...

Foto: divulgação


Q-Cult. “Como seria se...”. Flux Cia de Dança Contemporânea. 36 min. Classificação livre. Espaço Hibridus (60 lug.) – Av. 28 de Abril, 621 sala 403 – JG Shopping – Centro. 13/09 (qui), 19h30. Entrada franca. +info: (31) 3821-3513.

Comentários do dia

Amigos (as) leitores (as),

Na edição de hoje destaque para a entrevista com Sérgio Aragonés, criador da revista “Mad”, detentor do título de “cartunista mais rápido do mundo”.

Destaque ainda para o inicio das inscrições para o curso de Gestores Culturais promovido pela Secretaria de Estado da Cultura.

Não deixe de ler o debate acerca dos direitos autorais no Brasil e a nota de Fernando Brant sobre o ministro cibernético e suas declarações “ilógicas e imprecisas”.

Acima destaque para a Q-Cult que recebe a Flux Cia de Dança, no espaço Hibridus.

A todos uma boa leitura.

Entrevista com Sergio Aragonés, da revista "Mad"


Aos 70 anos, completados na última quinta (6/9), Sergio Aragonés ainda desenha com gosto e com a mesma velocidade que lhe valeu o título de "cartunista mais rápido do mundo": a Folha levou dois meses até conseguir entrevistá-lo, mas apenas 20 minutos, entre o pedido e o envio, para obter um auto-retrato para ilustrar a matéria.

Espanhol radicado no México e morando nos EUA há décadas, Aragonés tornou-se célebre por seus minicartuns para a revista "Mad", onde é o segundo colaborador mais longevo, trabalhando há 44 anos.

Ele acaba de retomar sua criação mais célebre, Groo, o errante, que ganhou no exterior uma edição especial para celebrar seus 25 anos e uma nova minisérie, "Groo: Hell on Earth", ainda sendo finalizada.

No Brasil, o personagem ganhou recentemente nova publicação, pela editora Opera Graphica, "Odisséia" (104 págs., R$ 49).

Falando por telefone de sua casa na Califórnia, Aragonés lembrou visitas ao Brasil e falou de Groo, da "Mad" e de sua vida.


Confira entrevista na íntegra.
FOLHA - Como é a edição comemorativa dos 25 anos de seu personagem Groo, que o sr. acaba de lançar?
SERGIO ARAGONÉS - É caprichada, tem uma capa prateada, mas é basicamente a mesma estupidez de sempre. A história é uma analogia que eu vinha tentando fazer há anos, sobre a Aids. Usamos um paralelo com uma praga que se transmite através de beijos, com o governo e a Igreja não fazendo muito para aliviar o problema.

FOLHA - E a nova minisérie que o sr. está criando?
ARAGONÉS - Estou desenhando um Groo agora, para o primeiro número, enquanto falamos. Serão quatro volumes, o tema é o aquecimento global. A história fala sobre os problemas causados pela poluição e todas suas conseqüências, e é claro que Groo acaba sendo o causador de vários dos problemas.

FOLHA - E como você e Mark Evanier [roteirista de Groo] trabalham?
ARAGONÉS - Já fizemos de diversas maneiras. Geralmente eu venho com uma trama, desenho algumas páginas a lápis e as levo para Mark, com os diálogos mal escritos, que ele apaga e substitui. Não sou muito bom com piadas escritas, meu humor é de pantomima, como o que eu faço para a "Mad". Às vezes ele sugere a trama e já houve casos em que escreveu tudo, como em "A Morte de Groo".

FOLHA - Groo é seu personagem preferido?
ARAGONÉS - Sim, já estamos juntos há tempos e é um personagem muito nobre porque seus direitos sempre foram meus, então ele nunca mudou. Muitos artistas criam um personagem e, como os direitos pertencem às editoras, acabam perdendo o controle sobre ele. Mas Groo ainda está intacto.

FOLHA - O sr. levou dez anos da criação do personagem até sua publicação. Por quê?
ARAGONÉS - Eu tinha vivido na Europa no começo dos anos 60 e vi que, lá, os autores eram donos de seu material, enquanto nos EUA era muito difícil que isso acontecesse. Então, quando cheguei no país, queria isso para mim, ter os direitos sobre minha criação. Levei vantagem sobre outros artistas porque eu estava trabalhando para a "Mad" e para a DC [editora de HQs], então não precisava desesperadamente de dinheiro, pude me dar ao luxo de esperar.

FOLHA - As histórias de Groo tem muito comentário político e social. Era esse seu objetivo ao criá-lo?
ARAGONÉS - Na verdade, não. Eu pensava nas aventuras de um bárbaro tolo, sem planejar muito à frente. Mas, com o tempo, eu via algo para o qual queria chamar a atenção das pessoas, criticar, ironizar, e escrevia baseado nisso, seja poluição, sem-tetos, arte moderna.

FOLHA - O sr. ainda é o cartunista mais rápido do mundo?
ARAGONÉS - Eu levo vantagem sobre os desenhistas que criam histórias sérias porque, como meus cartuns são de humor, as pessoas não notam quando eu erro algum personagem, faço um nariz maior ou um cabelo errado. A velocidade em si dá uma liberdade no traço com a qual é muito confortável trabalhar. Mas eu ainda levo 20 minutos para fazer uma página [ri]. É mentira, eu levo algumas horas. Esse mito começou porque eu desenho rapidamente quando estou em frente a platéias, para que elas não fiquem entediadas, e isso as espanta.

FOLHA - O sr. já era rápido quando criança?
ARAGONÉS - Eu era um artista muito ruim, sempre havia alguém muito melhor do que eu na escola. O que eu tinha era perseverança, continuei fazendo por tantos anos que acabei me desenvolvendo. Mas a velocidade não é importante, quando estou na minha mesa eu levo o tempo que precisar, só sou rápido em frente a platéias.

FOLHA - O sr. saiu da Espanha ainda criança, fugindo da guerra civil. Que lembranças tem dessa fase?
ARAGONÉS - Da Espanha fomos para a França, onde ficamos alguns anos, era a época da Segunda Guerra. Eu tinha 7 anos quando chegamos ao México, estava sempre desenhando, era um jeito de me expressar, era muito confortável criar minhas histórias. Meus primeiros desenhos de infância são relacionados à guerra, com aviões, porque era o que estava acontecendo. Estudei, fiz serviço militar no México e saí de lá aos 24.

FOLHA - E como foi a imigração para os EUA?
ARAGONÉS - Meu passaporte era mexicano, porque me tornei cidadão do país, sendo um refugiado. Cheguei nos EUA como turista, tentando vender alguns cartuns e, à medida que comecei a trabalhar, consegui tirar um green card [que permite morar no país].

FOLHA - Sendo um imigrante mexicano, como o sr. vê a situação de seus compatriotas nos EUA?
ARAGONÉS - É um problema muito sério. A maioria dos imigrantes que vêm do México são mão-de-obra de fazendas e indústria, e são tão abundantes que causam problemas para os trabalhadores daqui, que fazem propaganda negativa, levando a população a temê-los, pois acham que eles vão sobrecarregar o sistema de saúde e apenas usar os benefícios, e não é verdade. Os EUA não querem admitir que, sem os mexicanos, eles teriam muitos problemas na agricultura. Eles precisam dos trabalhadores e escondem esse fato. Poderiam dar vistos temporários, mas não podem negar o problema, como fazem.

FOLHA - Quando chegou aos EUA, o sr. pediu ajuda ao cubano Antonio Prohias [criador do "Spy vs. Spy"] para entrar na "Mad"?
ARAGONÉS - Sim, e foi muito engraçado porque ele falava ainda menos inglês do que eu. E chamava a todos de irmão, então me introduziu como se fosse seu parente, "meu irmão do México está aqui". Aí mostrei meu portfólio, a revista gostou e assim começou.

FOLHA - E já são 44 anos na revista. Quais suas melhores memórias desse período?
ARAGONÉS -* O publisher da revista, Bill Gaines [1922-1992], costumava levar todo o staff para uma viagem ao exterior uma vez por ano. Fomos para o Marrocos, México, Alemanha, Rússia, vários lugares, com todas as despesas pagas. Dividíamos os quartos com outros colegas da "Mad" e essas experiências eram maravilhosas porque tornaram a equipe uma família.

FOLHA - E de quem o sr. foi mais próximo?
ARAGONÉS - Prohias, Don Martin, Al Jaffe, Jack Davis... foram vários amigos, é uma fraternidade, não apenas trabalhamos para "Mad", somos uma família há muitos anos.

FOLHA - Quem foram seus mestres e suas influências?
ARAGONÉS - Aprendi pantomima com [o diretor e escritor chileno] Alejandro Jodorowski para melhorar meu trabalho como cartunista. Originalmente, minhas influências eram do humor, além de Carl Barks [1901-2000] e, acredite ou não, Will Eisner [1917-2005], eu adorava o jeito como ele contava as histórias, foi uma grande influência na minha escrita. O argentino Oski [1914-1979], cartunista maravilhoso, também me influenciou, assim como o mexicano [Abel] Quezada [1937-2007].

FOLHA - E o sr. sempre preferiu o humor em seu trabalho?
ARAGONÉS - Eu consigo escrever histórias sérias, fiz um western, "Bat Lash" [para a DC] e, quando comecei, escrevia para a [revista de horror] "House of Mystery". Mas, como desenhista, meu único interesse é o humor. Não pinto, não faço desenhos realistas, acho que uma das razões por que meu trabalho é admirado é porque nunca mudei, sempre fiz aquilo em que era melhor.

FOLHA - O sr. já esteve algumas vezes no Brasil, que lembranças tem daqui?
ARAGONÉS - Estive aí na década de 70, em Piracicaba (SP), e já havia vários fãs da "Mad" que conheciam meu trabalho, foi incrível. Depois voltei algumas vezes, a maioria como turista, a última na década de 80. Tenho alguns bons amigos aí, como [os irmãos] Ziraldo e o Zélio. Não tive mais tempo, mas ainda tenho de voltar ao Brasil.


FONTE:Folha de S. Paulo
Por: MARCO AURÉLIO CANÔNICO

Gestores culturais das áreas pública e privada recebem treinamento no interior do Estado


Com o objetivo de formar os gestores culturais das áreas pública e privada do interior do Estado, a Secretaria de Estado de Cultura de Minas Gerais, por meio da Superintendência de Ação Cultural (SAC), iniciou, em agosto deste ano, a realização de uma série de oficinas nos municípios mineiros. Depois de passar por Ituiutaba e Montes Claros, o Programa de Formação de Gestores da Área Cultural chega às cidades de Poços de Caldas (dias 14, 15, 21 e 22 de setembro), São João del Rei (21,22, 28 e 29 de setembro), Teófilo Otoni (18, 19, 25 e 26 de outubro), Três Marias (dias 19, 20, 26 e 27 de outubro) e Araçuaí (dias 23, 24 e 30 de novembro e 1º de dezembro).

A oficina visa à capacitação dos gestores para a criação e o gerenciamento dos projetos em todas as suas etapas, estimulando o debate sobre a importância da cultura para o desenvolvimento local. Com uma carga horária de 32 horas/aula, o curso é dividido em quatro módulos: introdução aos processos de gestão de projetos culturais; elaboração de projetos culturais; fontes de financiamento e captação de recursos; e gestão de projetos culturais.

O curso é direcionado aos servidores públicos e profissionais do setor privado que atuam na área cultural. As vagas são limitadas, sendo 70% para os servidores públicos e 30% para profissionais da iniciativa privada. As inscrições devem ser feitas junto às secretarias, fundações ou departamentos de cultura das prefeituras de cada município.

Serviço:
Programa de Formação de Gestores Culturais – Oficina de Elaboração, Captação e Gestão de Projetos Culturais.
Programação:

Poços de Caldas
Data: 14, 15, 21 e 22 de setembro
Informações: (35) 3697.2115/2389 – cultura_educ@pocosdecaldas.mg.gov.br
São João del Rei
Data: 21, 22, 28 e 29 de setembro
Informações: (32) 3372.7338/8711 – cultura@saojoaodelrei.mg.org.br

Teófilo Otoni
Data: 18, 19, 25 e 26 de outubro
Informações: (33) 3521.5189 – amuc@uai.com.br

Três Marias
Data: 19, 20, 26 e 27 de outubro
Informações: (38) 3754.5334 – dic.pmtm@yahoo.com.br

Araçuaí
Data: 23, 24 e 30 de novembro e 1º de dezembro
Informações: (33) 3731.3998 – social@aracuai.mg.gov.br / (33) 3731.4668 – produtoraluzdalua@yahoo.com.br / (33) 3731.1129 – ameje@uai.com.br


FONTE: Secretaria de Estado da Cultura

Direito autoral obtém vitória no Congresso Nacional

É retirado de pauta Projeto de Lei que ia contra o preceito constitucional de que ao autor pertence o direito exclusivo de utilização, publicação ou reprodução de suas obras.

De acordo com o PL 221/04, de autoria do Senador Sérgio Zambiasi, a autorização para qualquer uso de obra musical ou execução pública sem fins lucrativos não precisaria mais ser concedida pelo autor.

O pedido para retirada do PL foi feito por Roberto Correa Mello, presidente da ABRAMUS (Associação Brasileira de Música e Artes), diretamente ao deputado, por considerar tal projeto uma afronta ao autor e à lei constitucional. Segundo Roberto, “o artigo 5º da Constituição Federal, que defende os direitos fundamentais dos cidadãos brasileiros, guarnece o direito autoral em caráter incondicional, ou seja, geral, sem fazer qualquer referência se haverá ou não fim lucrativo quando da sua reprodução ou transmissão”.

A lei, se fosse aprovada, além de ser uma ofensa à liberdade do autor de optar por aprovar ou não o uso de sua obra para determinados fins, é vista pelo presidente da ABRAMUS como motivo de significante diminuição da já dizimada renda da classe dos artistas, principalmente musicais, “que já dispõem de renda não condizente com a realidade de seu esforço profissional, em virtude da deliberada reprodução não autorizada de suas obras (pirataria) ter atingido as proporções atuais”. Ainda, ficaria praticamente impossível a fiscalização quanto à finalidade lucrativa ou não da execução pública de uma obra intelectual.

“E é importante ressaltar que o próprio artista pode, sim, autorizar a utilização da obra sem que, no entanto, cobre por isso; mesmo assim, a autorização é imprescindível e não há motivos para que deixe de ser”, completa Roberto Mello.

* Com informações da Abramus


FONTE: Cultura e Mercado
Da Redação

No baile do Ministro da banda larga autor não entra

O ministro Gil fala demais e ninguém contesta. Chega. São quase 5 anos de ações, gestos e palavras inconseqüentes, declarações ilógicas e imprecisas, confusão mental e irresponsabilidade. Vamos a alguns fatos.

Em 2004, o Minc quis aprovar a ANCINAV, projeto intervencionista que acabou arquivado. O que poucos souberam é que, em meio a centenas de artigos, existiam 4 que, contra a Constituição, usurpavam direitos dos autores musicais. O ministro compositor, não satisfeito, passou a defender a flexibilização dos direitos autorais, além de maquinar desejos de estatização dessa conquista universal dos criadores e artistas. E começou a elogiar um ovo tipo de licença, o Creative Commons, inventada pelo professor americano Laurence Lessig, encampada por advogados ligados à Fundação Getúlio Vargas e pelo Minc.

Não creio que este engodo estivesse no programa de Governo de Lula. E nada disso foi discutido por Gil com a classe cultural. Mas, como se estivesse no palco e dele fosse senhor, resolveu fazer, dessa farsa, política de Estado. E cita Thomas Jefferson, que dizia que uma idéia não tem a força de propriedade de uma casa ou ferramenta. A obra artística é mais do que uma idéia e esta é, no máximo, ponto de partida para a criação. A noção que Jefferson tinha de idéia era muito precária. Ao mesmo tempo em que atacava a escravidão em seus textos, mantinha duzentos escravos negros sob sua posse. É semelhante ao compositor-ministro: defende a liberalização geral das obras pelos autores mas, apesar de ter sob controle toda as suas músicas, só licenciou uma canção, feita para um disco gravado na Noruega. As idéias, neste caso, realmente pouco valem.

Cultura se faz com criadores, sejam indivíduos ou uma coletividade. E o direito autoral é uma conquista da civilização. Vem dos ideais de liberdade, igualdade e fraternidade. O que se opõe ao iluminismo, que nos deu o direito autoral, é a barbárie. E essa parece ser a meta dos que defendem o Creative Commons. Eles sofismam e mentem quando dizem que os direitos autorais são caros. Quando, por exemplo, um cidadão compra um cd por 35 ou 40 reais, a parte autoral, para todos os compositores, é de cerca de 1 real (ou 8,4% sobre o preço médio de fábrica, que anda pelos 15 reais). O autor não impede a obra de circular; ele é que a faz circular pois é ele que a cria.

O ministro canta loas à tecnologia, mas não quer que os autores utilizem os avanços tecnológicos para preservar o que criaram. E o MINC incentiva empresas estatais a sugerir que os artistas renunciem a seus direitos. Quem está por trás desse massacre aos autores, dessa campanha mundial, economicamente forte e organizada? Certamente, os grupos que dominam a internet: a Microsoft, o Google, as telefônicas, que poderiam usar obras artísticas sem pagar. Por que o Gilberto Gil não propõe uma “ Technology Commons”, para que todos tenham acesso gratuito ao que os chamados provedores de conteúdo nos oferecem mediante pagamento?

Qualquer que seja o assunto, o ministro descobre um jeito de atacar os autores. Ele tem idéia fixa contra nós. Piratearam um filme? É hora de mudar a lei autoral. Ele acha normal que se faça cópias ilegais (é a modernidade, a tecnologia, a compulsão da juventude). Será que ele julga correto que se viole contas bancárias, se calunie pela internet ou se propague a pedofilia? Se tantos praticam um crime, a solução seria mudar a lei para que tudo (matar, roubar) seja permitido? Gil repete como ladainha essa concepção de mundo. Autor profissional não cai nessa, mas alguns autores jovens se convertem a essa religião suicida.

Universitários e professores desavisados passam a defender tal anarquia. Quem defende a barbárie não é moderno nem revolucionário. Quem está a favor dos direitos não é conservador: é civilizado. Autores, artistas e músicos brasileiros: protejam-se do ministro bárbaro, exterminador de criadores.

Lembrem-se da lição de Cacilda Becker: “não me peçam de graça a única coisa que tenho para vender”.


FERNANDO BRANT, compositor. fernandobrant@hotmail.com
Fernando Brant

Afago cultural

Com direito a canja de Naná Vasconcelos, o bandolinista Hamilton de Holanda e o violonista Yamandu Costa encerraram, na noite de domingo, a quarta edição da Mostra Internacional de Música em Olinda (Mimo), um festival que poderia se realizar em qualquer cidade histórica mineira pela sua proposta estética: a maior parte dos recitais é organizada no interior das centenárias igrejas. Na colonial Sé de Olinda, repleta de gente - por dentro e por fora, onde um telão reproduzia o espetáculo -, a dupla de cordas pôs término a uma jornada pela música instrumental que começou na última quarta-feira no mesmo local com o internacionalmente reconhecido violoncelista Antonio Meneses e a pianista e professora da UFMG Celina Szrvinsk.

Durante cinco dias, a comunidade pernambucana teve acesso gratuitamente a 27 concertos de mais de 300 músicos. A organização estima que mais de 25 mil pessoas foram platéia no evento, o que é muito se pensarmos que Olinda é a terra do frevo, do maracatu, do mangue beat e não tem exatamente uma tradição de consumo de música erudita. "A ‘sacada maravilhosa são as igrejas, e o povo sabe receber, concentrando-se e se soltando na hora que precisa", conta Hamilton de Holanda, referindo-se a talvez o único momento em todos os espetáculos em que a platéia fez barulho: no emocionante encerramento, durante a canja de Naná, que puxou um cortejo com ele e Yamandu no altar e terminou com todos cantando "As Pastorinhas".

O percussionista Paulo Santos teve impressão semelhante. "Foi uma grata satisfação, sentimos a reação do público que lotou a igreja, um silêncio total, uma grande expectativa de entender e absorver nossa música. O Mimo é uma audácia", completa o integrante do Uakti, que se apresentou na cidade na quinta-feira, poucas horas antes de Naná fazer o seu próprio show, com Egberto Gismonti, retomando uma parceria desfeita há quase três décadas, quando, juntos, lançaram premiado o álbum "Dança das Cabeças". Algumas apresentações da Mimo foram realmente memoráveis, como a primeira vez no Brasil dos 12 instrumentistas de cordas do Czech Chamber Soloists.

O piano de João Donato e a clarineta de Paulo Moura também dialogaram, na nave do Seminário de Olinda, ao anoitecer do sábado, na mesma hora em que o violoncelista norte-americano Eugene Friesen tecia seus improvisos na igreja de São Pedro, obrigando o público a uma escolha entre ambos os programas. Nem mesmo a chuva que caiu durante o dia, impediu que os dois recitais lotassem. E quem optou pelo cello pôde ver Naná, de novo ele, em outra canja, com Friesen.

Pedagogia Além dos recitais e uma seleção de filmes afins em praça pública, a Mimo ofereceu mais de 60 atividades educativas com os artistas envolvidos e que contemplaram 627 alunos inscritos. Tudo de graça. Dessas, a mais pretensiosa certamente foi a de regência, coordenada pelo maestro Isaac Karabtchevsky, com 141 regentes inscritos e na qual os seis alunos mais destacados tiveram a oportunidade de conduzir, num concerto, a Orquestra Petrobras Sinfônica. "É um marco divisório no Brasil. É a primeira vez que se faz um curso de regência com uma orquestra profissional como essa. Normalmente são com estudantes de música", disse o maestro após o recital. "Isso é importante para se desbravar horizontes e talentos. Há muitas pedras para serem descobertas e lapidadas", diz Karabtchevsky, antevendo o surgimento de novos artistas a partir das iniciativas pedagógicas da Mimo. Com várias passagens por Minas Gerais no currículo, Karabtchevsky acredita que um festival como este seria sucesso no Estado. "A experiência da Mimo serve a Ouro Preto, ou mesmo a todas as cidades históricas que têm passado", analisa o maestro. Lu Araújo, idealizadora da Mimo, não descarta a possibilidade de, futuramente, o festival chegar a Minas Gerais. 3

"A mostra em Olinda pode ser um festival-mãe, com edições em outras cidades. Ouro Preto é um sonho porque Minas tem algo que o Pernambuco não tem, que é mão-de-obra especializada. Estamos formando técnicos aqui", diz Lu, que foi produtora de nomes como Elza Soares, Elomar, Zeca Baleiro e João Nogueira e concebeu a Mimo em 2002, após freqüentar o Carnaval em Olinda. "Depois de conhecer o Brasil todo, queria fazer um projeto fora do eixo Rio-São Paulo. Essas igrejas foram construídas num contexto em que havia a música, mas não bastava apenas ocupá-las, eu queria criar uma cena, permitir acesso a informação", diz a empresária, que há quatro anos iniciou o projeto com cerca de R$ 100 mil em patrocínio para cinco concertos e, na edição de 2007, obteve R$ 1 milhão de investimento do setor público e privado para a realização do festival.

Armorial
A produtora da Mimo conta que a definição da programação deve evitar a obviedade. "Isso é um desafio, o tratamento não é de um público de periferia. Estreamos muitos programas e estimulamos a produção local", conta Lu, cujo projeto busca abrir espaço para a cultura nacional. Nesse sentido, o recital da atriz e cantora Inez Viana e o Grupo Gesta foi a síntese da proposta do Mimo. O concerto, no Seminário de Olinda, na sexta, reuniu modinhas feitas em parceria pelo compositor pernambucano Capiba e o escritor paraibano Ariano Suassuna e que representam musicalmente o movimento armorial. Lançado em 1970 por Suassuna, o movimento Armorial propunha elevar a cultura popular nordestina ao status erudito. Responsável pela abertura da celebração dos 80 anos de vida do escritor, este ano, em show no Rio de Janeiro, Inez conta que "sentiu-se em casa" com o convite para participar da Mimo.

"Tem tudo a ver com o movimento armorial de juntar o erudito e o popular. É como uma volta às origens, à música que se fazia originalmente dentro dessas igrejas", diz Inez, que pretende registrar o espetáculo em DVD e em novembro começa a ensaiar, com o diretor Aderbal Freire Filho, a peça "A Farsa da Boa Preguiça", de Suassuna. "O ator mineiro Rodolfo Vaz está no elenco. Devemos encenar a peça em Belo Horizonte em janeiro de 2008", completa a atriz. O repórter viajou a convite do festival


FONTE: O Tempo
Por: Marcelo Fiuza