
quinta-feira, 30 de agosto de 2007
Comentários do dia
Na edição de hoje levantamos uma pergunta que assola a cabeça dos professores de língua portuguesa, e que muitos poucos conseguem responder com precisão: “Com ou sem trema?”
Destaque ainda para a baixa leitura dos brasileiros e, assim mesmo, os livros têm se mostrado a cada dia uma fonte de renda promissora.
O debate que começou no início da semana em Belo Horizonte sobre o ensino da arte circense no Brasil e a abertura do concurso Fotocross 2007.
Importante ainda ressaltar o debate sobre como fazer para que os professores aceitem e permitam a utilização de ferramentas tecnológicas no dia-a-dia da escola, iniciada pelo francês Pierre Levy, em visita ao Brasil.
Vale lembrar que Juarez Moreira se apresenta neste domingo no Teatro do Centro Cultural USIMINAS conforme divulgação acima.
A todos uma boa leitura.
Ruídos lingüísticos (com trema, por enquanto)
A implementação do acordo, adiada diversas vezes desde 1994, poderá ocorrer a partir de janeiro de 2008 nos três países da Comunidade dos Países da Língua Portuguesa (CPLP) que já ratificaram o protocolo: Brasil, Cabo Verde e São Tomé e Príncipe.
Facilitar o processo de intercâmbio cultural e científico entre os países e garantir a divulgação mais ampla do idioma são os principais objetivos da unificação ortográfica que, entre outras decisões, elimina o acento circunflexo em palavras paroxítonas terminadas em “o” duplo (como “vôo” e “enjôo”), extingue o trema e inclui as letras K, Y e W no alfabeto.
Para o Ministério da Educação brasileiro, a divergência de ortografias do português prejudicaria sua divulgação e prática em eventos internacionais. As mudanças necessárias em livros escolares e arquivos de editoras seriam compensadas pela atenuação do alto custo da produção de diferentes versões de dicionários e livros.
Mas a resistência é grande em alguns meios, principalmente em Portugal, onde haveria o maior impacto na língua – com o acordo, desaparecem o “c” e o “p” não pronunciados, como em “acção” e “baptismo”. Os portugueses precisarão também trocar a grafia de “húmido” por “úmido”.

Para o professor, a reforma é desnecessária e se fundamenta em um grande desconhecimento da natureza, das funções e dos usos da ortografia. Especialista em fonética e fonologia, Cagliari publicou 11 livros e atua na pesquisa em sistemas de escrita, prosódia, ortografia e na história da ortografia da língua portuguesa.
Luiz Carlos Cagliari – As reformas ortográficas têm sido feitas sem o conhecimento científico do que vem a ser a ortografia. Desse erro original deriva uma série de equívocos. Mas a questão fundamental não é se as mudanças serão feitas em determinadas regras. O fundamental é saber se há necessidade de mudança. Os argumentos dados para justificar uma reforma como essa são, em geral, falhos.
Agência FAPESP – Poderia dar exemplo desses argumentos?
Cagliari – Um deles é “facilitar o uso da língua”. Mudar a ortografia não facilita a vida de ninguém, porque a ortografia não representa a fala de ninguém. É simplesmente uma representação gráfica que permite a leitura. Não vou ler Camões na pronúncia dele, mas na minha. Como todos fazem isso, a ortografia não representa a pronúncia de ninguém.
Agência FAPESP – A unificação não facilitaria a comunicação diplomática entre os países?
Cagliari – Unificar a ortografia é um equívoco. Apesar de seguir regras de uso, tiradas de uma tradição, a ortografia, como a linguagem em geral, sofre transformações no tempo e no espaço. A história da ortografia mostra que a escrita se transforma continuamente. Veja, por exemplo, os corretores ortográficos dos computadores, que apresentam variação de opções de ortografias regionais para línguas como o inglês e o francês, ambas tradicionais. O inglês tem uma ortografia britânica e outra americana, ambas tradicionais. Então, por que precisamos ter apenas um modelo? O problema diplomático atinge somente a língua portuguesa? Ou é um falso problema?
Agência FAPESP – Alguns críticos dizem que a reforma forçará uma mudança em todos os livros didáticos, dicionários e arquivos de editoras, mas que seria uma reforma superficial, que não chegaria a cumprir o objetivo de padronizar a língua.
Cagliari – A idéia de simplificar a ortografia é uma ilusão desse tipo de reforma ortográfica. Talvez a única simplificação seja a abolição do trema – que ainda terá exceção. Isso não representa grande coisa. Na realidade, não precisaríamos de sinal algum além das letras. Nem acento, nem trema. O inglês não tem sinais diacríticos e não cria problemas aos usuários.
Agência FAPESP – A reforma só faria sentido, então, se fosse mais profunda?
Cagliari – Há grandes confusões nas bases ou regras da língua, com relação ao hífen, por exemplo. Poderia haver apenas uma regra que dissesse que as palavras compostas por composição levam hífen e as compostas por derivação não levam. O uso de acento gráfico em português também gera confusão. Há um número enorme de regras, todas desnecessárias, porque o falante sabe onde cai o acento nas palavras e quais vogais são abertas ou fechadas. Tirar uma regra ou outra não muda muito.
Agência FAPESP – As dificuldades de implantação da reforma são grandes demais comparadas aos benefícios?
Cagliari – Venho dizendo há décadas: o melhor é não mexer na ortografia, não fazer leis, deixar a tradição – recomendada pelos dicionários, gramáticas, vocabulários ortográficos – fazer sua história. Hoje, temos que lidar com e ler muitos documentos antigos, escritos em outras ortografias, e nada disso perturba, nem mesmo os juristas, que precisam desses documentos para se pronunciar em processos.
Agência FAPESP – A ortografia deveria se basear na tradição e não em leis?
Cagliari – Seria melhor. Os usuários agem da seguinte forma: ou sabem escrever – e o fazem com certeza – ou têm dúvidas. Nesse caso, não adianta pensar, a solução é olhar no dicionário e não ficar procurando regras nas gramáticas. As regras, estudadas apenas em alguns momentos da escola, ajudam. Mas, na hora da dúvida ortográfica, o que salva os usuários comuns não são as regras, mas o conhecimento de outros fatores, como a etimologia e a comparação.
Agência FAPESP – Entre as mudanças propostas, quais o senhor considera mais impactantes? Nenhuma delas é imprescindível?
Cagliari – Em uma reforma, ninguém ganha e muitos perdem. No caso desse acordo, nenhuma mudança sugerida é necessária. Poderíamos ficar com o que tínhamos e nada mudaria. A grande confusão veio quando resolveram transformar a ortografia em lei, um absurdo tão grande quanto o fato de terem tornado oficial uma nomenclatura gramatical brasileira. Uma aberração sem tamanho.
Agência FAPESP – A maior resistência à reforma vem de Portugal. Por que isso ocorre? O senhor vê, como alguns, uma “brasilificação” da língua com essa reforma?
Cagliari – Estive em reuniões em Portugal com acadêmicos e escritores que discutiam a unificação. Eles acham a reforma totalmente desnecessária. De fato, esta reforma, ao contrário da feita na década de 1910, representa um gesto brasileiro contra a tradição da língua. Para uma pessoa culta, a escrita traz as marcas da pátria, da história, e isso fica prejudicado por leis que pretendem que todos sejam iguais.
Agência FAPESP – A padronização tornará os livros atuais obsoletos?
Cagliari – Isso é um problema que decorre, como todos os outros, de transformar a ortografia em lei e não da reforma ortográfica em si mesma. Alguém poderia propor alterações na grafia das palavras e, se os usuários passassem a aderir, com o tempo viraria tradição, como sempre ocorreu. Se não for oficial, a ortografia pode aparecer de modos diferentes e os livreiros não precisam jogar nada no lixo. Nem precisaríamos jogar fora os livros escolares de nossas bibliotecas escolares porque estão com a ortografia errada.
Agência FAPESP – Quem sofrerá maior impacto com a reforma?
Cagliari – Os literatos sofrerão mais, porque a ortografia também pode ter valor estilístico, como vemos em autores como Saramago. Por outro lado, em um país em que grande parte da população não lê, uma reforma ortográfica vem perturbar apenas os letrados.
Agência FAPESP – Tivemos reformas em 1919, 1943 e 1971. O português muda demais?
Cagliari – Poderíamos ter seguido o exemplo das línguas francesa e inglesa que, apesar da longa tradição de brigas por reformas ortográficas, se mantêm há séculos sem grandes mudanças. Mas entramos em um caminho errado. Isso ocorre porque, para entender a ortografia, precisamos saber que a leitura não é transcrição fonética nem semântica, portanto basta reconhecer na escrita o que o usuário fala. A ortografia foi criada para neutralizar a variação lingüística: não interessa se você fala “tia” ou “tchia”. A escrita é uma só: tia. A letra “A” representa o som de todos os “As” falados em todos os dialetos em todas as palavras da língua. Assim, na palavra “acharam”, que se pronuncia “acharu”, o “A” tem o som de “U”.
Agência FAPESP – Quanto tempo uma reforma dessas deve levar para ser assimilada pelas populações?
Cagliari – Em relação à reforma de 1919, constatamos que somente na segunda metade do século 20 as pessoas aderiram de fato. E nem todas. As publicações só adotaram a reforma 50 anos depois. Nas reformas posteriores, a intervenção do Ministério da Educação nas escolas, nos livros e nas editoras foi ameaçadora, como é hoje: ou tudo ou nada. Com relação às pessoas cultas, a reforma começa logo, por força social. Na escola, é um grande problema para os professores e menor para os alunos, que não precisam modificar o que sabiam antes. Para o povo, pouco interessa. Muitos continuarão escrevendo fora de qualquer padrão tradicional ou imposto por lei, mas de acordo com hipóteses que fazem de como podem escrever para alguém ler e entender o que eles querem dizer.
FONTE: Agência Fapesp
Por: Fábio de Castro
O Livro como Fonte de Renda
No entanto, ainda é preciso lutar contra muitos obstáculos, contra muitas artimanhas desenvolvidas pelos distribuidores e livreiros, artimanhas estas geradas por uma política econômica nacional de juros altíssimos - que no mínimo inibem os investimentos - e que, "contaminando" o pensamento dos que trabalham neste ramo, prejudicam seriamente o desenvolvimento de um mercado que, a exemplo do que ocorre nos países desenvolvidos, é um dos mais lucrativos. A taxa de desconto cobrada por muitas distribuidoras, superando os 50% do preço de capa, deveria ser menor. Não houvesse uma porcentagem tão alta e o livro poderia chegar ao consumidor por um valor bem menor, facilitando vendas e possibilitando o acesso à cultura para um maior número de pessoas. A mentalidade colonialista que impera na maioria das editoras brasileiras - mentalidade esta provavelmente ditada por uma tendência que vem do próprio povo e que está no velho ditado "santo de casa não faz milagre" - determina a preferência editorial por autores estrangeiros, em detrimento dos patrícios que, certamente não têm menos valor que um Sheldon, um Robbins ou um Higgins. Temos brasileiros que escrevem muito bem, que possuem idéias excelentes e que poderiam se tornar grandes, desde que editados e, evidentemente, lidos. O preconceito pior parte dos livreiros - contra o qual nós temos lutado muito - de que o livro de bolso não tem aceitação por parte dos leitores, é um outro fator impeditivo de uma maior divulgação dos livros no seio do grande público. Um livro de bolso pode conter exatamente o mesmo texto que uma edição de luxo, com a vantagem de custar menos, justamente por não pensar em ostentação e apresentação luxuosa. O valor daquilo que está escrito é imutável. Ou presta ou não presta e cabe ao editor, antes do leitor, saber filtrar aquilo que irá levar às prateleiras das livrarias.
São espinhos que aqueles que desejam ingressar nesse mercado, têm de vencer. É uma luta que se deve abraçar contando como principal arma, a necessidade que o povo brasileiro vem demonstrando, de melhorar seu nível cultural para que, não apenas em reservas cambiais, de fato passe a trilhar o caminho do Primeiro Mundo. O brasileiro sabe que para se equiparar a qualquer outro povo mais desenvolvido, o requisito primordial é a cultura e, exatamente por isso, vem procurando aumentar em primeiro lugar, o seu nível de leitura.
Autores novos, talentosos, surgem a cada dia. Porém, esses gênios continuam apagados porque seus trabalhos não são divulgados, não são publicados, não são vendidos, não são lidos. São os preconceitos e os temores das editoras os principais motivos para que esses novos luminares jamais apareçam.
Há os mais ousados, os que se arriscam uma vez, levam sua obra a uma gráfica, mandam imprimir e... infelizmente, fracassam. Esse fracasso foi determinado principalmente pela falta de orientação editorial. Uma gráfica simplesmente executa o serviço gráfico que, inclusive, pode ser muitíssimo bem feito. Contudo, fazer um livro não é apenas mandar imprimir cento e tantas páginas de papel. Há que se editar o livro. Há todo um processo de revisão, desde a simples revisão datilográfica e ortográfica, até mesmo a delicada e sutil revisão literária, em que o editor apreende a idéia do autor e a retransporta para o papel, colocada em termos claros, lisos, escorreitos e de fácil entendimento.
Por isso a necessidade de uma editora. Temos visto obras de bons autores, bem escritas e com idéias excelentes, que não conseguiram "decolar", simplesmente por falta de quem as editasse convenientemente.
O custo editorial não é barato mas, as vantagens vistas no produto final são inegáveis. Uma obra que tenha o respaldo de uma editora e que não seja uma mera "produção independente", tem toda uma tecnologia e todo um know-how em sua execução, que permite a aceitação pública mais imediata.
Aceitação que vai desde a apresentação do livro, com a escolha de uma boa capa e um bom título, até a elaboração da idéia, no miolo do livro e a sua explanação ao leitor.
FONTES: www.ryoki.com.br/textos.htm e Overmundo
Por: Georges Kirsteller
Concurso de Fotografias
A terceira edição da maratona fotográfica Fotocross 2007 começa no próximo sábado, dia 1º de setembro, quando os interessados deverão efetuar a inscrição e entregar seus trabalhos. Com o apoio do Ministério da Cultura, por meio da Lei Federal de Incentivo à Cultura, a competição aceitará até o limite de 400 inscrições, podendo concorrer tanto fotógrafos profissionais, como amadores.
Os participantes terão de concorrer em dez temas, entregando material com, no máximo, 36 fotografias. Além disso, devem ilustrar cada categoria com uma ou mais imagens, não tendo o fotógrafo obrigatoriedade de entregar as fotos na ordem dos temas.
Serão premiados os melhores trabalhos desenvolvidos em cada uma das dez categorias, podendo um só concorrente acumular dois ou mais prêmios. Além dos R$ 5 mil em premiações - sendo R$ 500 para cada tema -, serão atribuídas menções honrosas. Para a solenidade de divulgação dos resultados, no dia 15 de setembro, às 19h, serão selecionadas, pelo menos, uma fotografia de cada concorrente para exibição.
A taxa para participar da maratona é de R$ 10,00. As inscrições devem ser feitas a partir das 9h, na sede da Chave Mestra (Rua Monte Alegre, nº 277), no bairro de Santa Teresa, no Rio de Janeiro. O material deve ser entregue até às 21h, ou seja no mesmo dia inscrição.
Informações: http://www.chavemestra.com.br/ e (21) 2507-5352.
FONTE: Ministério da Cultura
O ensino de arte circense em debate
A realização do seminário vem reforçar a proposta do evento de não ser apenas fonte de entretenimento, mas, também, de reflexão sobre o fazer artístico. "É importante que as pessoas conheçam a história do circo e de sua produção", destaca Fernanda Vidigal, uma das organizadoras do Mundial de Circo.
Estarão reunidos no seminário algumas das mais importantes academias de circo do mundo - entre elas a Escola Nacional de Circo da Bélgica, a do Canadá, a da França e a Spasso Escola Popular de Circo (BH).
Mediando o debate, duas importantes pesquisadoras da cultura circense: Alice Viveiro de Castro, que foi gerente de projetos da área, na Funarte, durante seis anos, e Ermínia Silva, que, além de mestre e doutora em cultura circense pela Unicamp, é filha de Barry Charles Silva, um dos principais representantes de famílias circenses do Brasil. Além do debate, as duas ainda farão lançamento de seus respectivos livros sobre o circo.
Ermínia adianta que um dos principais pontos a serem discutidos é a função das escolas como força propulsora de uma nova dinâmica entre os artistas. "As escolas não funcionam como agregadoras de novas tecnologias. O circo sempre foi contemporâneo e ligado às coisas de seu tempo, às expressões artísticas e invenções tecnológicas. As escolas, na verdade, têm um importante papel de ampliar a incorporação e a democratização da linguagem circense", avalia Ermínia.
"Antes, a arte circense só era passada de família a família, hoje há maior flexibilidade de aprendizado porque não há necessidade de uma pessoa se incluir num grupo itinerante para aprender. Ao mesmo tempo, cria um novo processo de organização da atividade circense, já que são os tradicionais artistas de circo que dão o pontapé inicial na fundação das escolas", completa.
AGENDA - Seminário "O Papel das Escolas na Produção Circense Contemporânea", de hoje a sexta-feira, das 14h às 17h, na Funarte Casa do Conde (rua Januária, 130, Floresta). Entrada franca (platéia limitada a 200 pessoas); Lançamento do livro "O Elogio da Bobagem - Palhaços no Brasil e no Mundo", de Alice Viveiro de Castro, amanhã, às 20h, no Palácio das Artes (av. Afonso Pena, 1.537, centro); Lançamento do livro "Circo-Teatro: Benjamim de Oliveira e a Teatralidade Circense no Brasil", de Ermínia Silva, no dia 31, às 18h, também na Casa do Conde.
FONTE: O Tempo
Por: Liliane Pelegrini
Tecnologia para qual educação?
Neste “encontro-laboratório”, o acadêmico, autor de conceitos hoje popularizados para definir relações de rede em redes virtuais, em especial na Internet, como a “Inteligência Coletiva”, tema do encontro em questão, analisou a forma como estão estruturados o Portal EducaRede, da Fundação Telefônica, e o Portal Rede Social, da Secretaria de Assistência e Desenvolvimento Social do Estado de São Paulo. Mas ficaram, daí, ganchos importantes para se entender e para provocar, sobre a forma como trabalhamos nossa educação e os norteadores das fundações e ONGs mantidas com recursos, geralmente públicos pois oriundos de recursos dedutíveis de impostos e que, como Lévy colocou, buscam objetos públicos, não necessariamente respeitando dinâmicas e impulsos das comunidades em que atuam.
Entre estes pontos, dos quais vale o “pitaco” do pesquisador pelo distanciamento que é facilitado a alguém de fora do nosso cotidiano, posição em que Lévy se coloca, vale ressaltar o de que não se cria um movimento social, ou uma rede social, ao se criar, por exemplo, um portal. O objetivo, o prêmio social, precisa ser muito atraente, e é necessária a figura dos líderes, que devem emergir naturalmente durante os processos. Estes objetivos, por sua vez, são a essência das comunidades sociais, e vem das pessoas que as compõe.
Ficam, porém, algumas questões, a que talvez não seja possível responder nesta reportagem, e talvez não ainda em muitas outras: o uso das tecnologias informacionais nos espaços educativos constituídos é estritamente necessário, dada a permeabilidade, em especial da escola? Há, hoje, um ciberaluno no grosso de nossas salas, ou estes ainda são uma elite? E quem ou o que seria este ciberaluno? Qual o papel do professor frente a este aluno midiatizado?
Enquanto isso, na escola e na Câmara
As respostas a essas questões aparecem, pouco a pouco, em tentativas de trazer equipamentos tecnológicos para a escola, transformando a estrutura do ensino. Uma opção? “Eu tenho certeza que não devamos opor o presencial ao on-line. Nós podemos trabalhar com as mesmas regras fazendo algo no computador que será colocado on-line, por exemplo, ou podemos ajudar uns aos outros a resolver problemas que nós estamos enfrentando, on-line ou presencialmente. Então, a questão não é o on-line e o presencial, é entrar numa nova cultura de trabalho colaborativo, de aprendizado colaborativo. E também esta noção de que a principal fonte de valores é o conhecimento, e que o conhecimento pode ser acumulado coletivamente e ser acumulado on-line colaborativamente”, pontuou Lévy. Rogério Costa, mediador do debate e professor do LInC, coloca, por sua vez, que não é a tecnologia que dará para as pessoas as competências para atuar em redes sociais, ou para o processo educacional, em relação ao que diz: “não é poder usar esta tecnologia que permitirá alguma alteração, algum avanço no aluno. A questão não é treinamento ou capacitação no digital, mas é a educação no digital”.
Indo para o campo experimental, vale atentar para projetos como a aplicação do programa internacional “Um Computador por Criança”, no Brasil (One Lao Top Per Child). O programa, hoje com 275 máquinas em uma escola no bairro de Parada de Taipas, na periferia da cidade de São Paulo e entrecortada pela Serra da Cantareira, tem como proposta o uso de computadores à razão de 1 para 1 para alunos e professores, durante as aulas presenciais, para exposição de conteúdos e para pesquisa após as aulas. Também foram inseridas mídias de captação, como câmeras de vídeo e fotografia, numa proporção equipamento aluno menor, e com o objetivo de permitir aos alunos produzir conhecimento, para seus colegas de turma e para o restante da escola. “Um exemplo foi uma visita feita recentemente por alguns alunos na Estação Ciência. Os alunos filmaram alguns experimentos e explicações, e os levaram para os colegas”, conta Roseli de Deus Lopes, coordenadora do projeto e diretora da Estação Ciência.
Ainda de acordo com Lopes, a experiência tem sido positiva, principalmente por ter sido desenvolvida junto com os professores. “Há uma necessidade, para que o projeto funcione, de que a escola tenha autonomia em sua aplicação. Nós damos suporte, mas quem decide o que e como será aplicado é a gestão da escola, em parceria com os professores. Na aplicação inicial, com uma segunda série e uma quinta série, os professores primeiro conheceram o equipamento, para depois analisarem como utilizá-lo, facilitando o aprendizado da escrita e de outras disciplinas, como geografia e ciências”. Estão em implantação e estudo a construção de um blog coletivo e de textos coletivos, os últimos a partir de ferramentas Wikipédia, assim como o ensino de ferramentas de programação e de conhecimento em hardware e reparação ou troca de peças defeituosas. O experimento conta ainda com a participação de alunos das sétimas e oitavas séries, como moderadores.
A questão, para Lopes, é cultural, e perspassa tanto a necessidade de ensinar, a professores e alunos, que a construção do conhecimento no ambiente escolar diz respeito também à forma como se constrói este conhecimento, e na forma como alunos e professores se dispõe a utilizá-los, apropriando-se das tecnologias e descobrindo sua pró-atividade. Defende ainda que há a necessidade de se alterar a estrutura das escolas, pensando espaços diferentes, relações diferentes entre professores, não mais responsáveis pelo domínio de um conhecimento estático, mas por uma melhor gestão do conhecimento.
“Algumas das transformações que acontecerão a gente não tem noção do que serão, mas é certo que hoje uma série de ferramentas é pouco utilizada, pela falta do hábito de colaborar em ambientes virtuais ou não. As novas gerações estão com esta cultura em desenvolvimento, mas não é possível saber a que resultados chegaremos”, diz a professora, ao que completa: “estamos trabalhando com tecnologias deste século e conceitos pedagógicos do século passado. É preciso repensar estes conceitos, e inclusive as estruturas curriculares e as grades de aulas”. Ainda de acordo com a pesquisadora, mudada esta cultura o ideal seria que as crianças tivessem liberdade para o uso dos computadores, mediada pelo professor, para que estes computadores não tenham a mesma função de Lan Houses. O papel do educador é o de um orientador, responsável por ajudar o aluno a entender os riscos e as possibilidades dos meios, que se somem à curiosidade dos alunos e lhe possibilitem, de forma autônoma, entender problemas e aprender a usar e entender os dados e mecanismos oriundos, inclusive, de sua realidade.
Discutindo ainda sobre o paradigma atual de estrutura curricular e de metodologias de ensino, outra transformação começa a se constituir: a inserção, após muito debate, de elementos da cultura e da história africana, indígena e populares – como a caipira e a ribeirinha – nos currículos básicos. A valorização destes aspectos, por sua vez, indica uma possibilidade de mudança no foco do ensino formal – da valorização de conhecimentos de uma cultura dita elevada para a valorização dos elementos culturais formadores do cotidiano, e dos processos que contribuíram na formação destes conhecimentos e modos de vida. A discussão destas questões está em andamento na Câmara Federal. Para Lévy, a questão diz respeito ainda à administração dos conhecimentos como elemento formador de comunidades, e gerador de identidades e de memórias coletivas, o princípio das redes sociais.
Se esta escola, se esta escola fosse minha
Mas é possível pensar em inclusão no atual paradigma da educação no Brasil, com salas lotadas e bibliotecas mal utilizadas? Para Sergio Amadeu, professor da pós-graduação em Comunicação da Faculdade Cásper Líbero e responsável pela implantação dos telecentros, ambientes de acesso à Internet da Prefeitura de São Paulo, a dificuldade não está nos recursos, mas nas dinâmicas destes espaços: “Falta motivação ao professor, e o elemento chave para gerá-la é a rede, é se sentir útil numa rede, e isso ocorre a partir do momento em que o professor assume a figura de orientador, de explorador, e a consciência de que é o primeiro estudante da turma que coordena, portanto o mais experiente e mais preparado para explorar estratégias e construir conhecimento. Assim, podemos romper barreiras culturais, construídas por professores e estudantes”.
Amadeu entende ainda que todo sistema educacional está montado em cima de um sistema de ensino, que não tem como acompanhar a velocidade do avanço em informação e conhecimento, especialmente no contexto atual, motivo pelo qual as estruturas de ensino não conseguem absorver a dinâmica das novas tecnologias. “E, por isso, a sociedade da informação é a sociedade da ignorância, e nela você tem de se preparar para acompanhar e selecionar a informação que tem alguma qualidade. O ensino precisa ser reorganizado, através de elementos de tensão positiva. É necessário ter o computador como intermediário forçando uma nova reflexão, um novo tipo de ensino”. Considerando que as técnicas tradicionais de ensino não atentam para a possibilidade de novos caminhos e formas de construir conhecimento, Amadeu acredita que a mudança só será possível a partir de processos “Botton Up”, a partir de iniciativas vindas da ponta da rede. “O gestor, por sua vez, precisa incentivar estes processos”, completa.
Rogério Costa completa as idéias de Lévy e de Amadeu: “Para o ambiente educacional formal se adaptar a estas novas tecnologias, ambas tem de atuar como estruturas abertas, que se complementam. Não é preciso pensarmos numa substituição completa, anulando uma aula presencial. O que se pede é que os professores assumam outros papéis, o de orientadores, o de líderes e o de estimuladores de lideranças, pois as regras que se estabelecem no uso de ambientes virtuais, não podem ser, de forma alguma, obstáculos à próatividade. Por esse viés, não se supõe que a atividade presencial possa ser substituída pela atividade virtual, mas que ambas vão constituir cada vez mais o universo da aprendizagem, pois a presencial tem aspectos positivos e importantes, como a relação entre os alunos e a atenção do professor específica aos alunos, percebendo diferenças e necessidades de cada um”.
Para Ronaldo Lemos, professor da Escola de Direito da Fundação Getúlio Vargas, no Rio de Janeiro, e representante do consórcio Creative Commons no Brasil, “estamos assistindo de modo geral ao surgimento de modelos novos de gestão do conhecimento, que se distanciam do modelo tradicional do século XX. Na área de educação isso não é diferente: o modelo tradicional de conhecimento ‘fechado’ convive agora com o surgimento de modelos novos, baseados no acesso aberto aos conteúdos. É interessante notar que o modelo aberto vem ganhando cada vez mais força e essa abertura se dá tanto nas plataformas tecnológicas de ensino quanto também no regime de acesso aos conteúdos, que passa a ser cada vez mais aberto”.
Em outro seminário ligado ao tema, realizado na Cidade do Conhecimento e relatado no site da instituição [http://www.cidade.usp.br/blog/], núcleo de pesquisa da Universidade de São Paulo, uma das respostas ao que é o ciberaluno diz respeito a apropriação destas tecnologias e destas redes, ao que o professor Gilson Schwartz colocou que "Emancipação Digital vai além da Inclusão Digital. O digital deve ser apropriado pelas pessoas que devem usá-lo num âmbito mais político e como forma de produção de conhecimento. A Internet por si só não gera conhecimento, para isso acontecer, é preciso que haja conteúdo sendo construído e colocado em circulação por essa inteligência coletiva".
FONTE: Cultura e Mercado
Por: Guilherme Jeronymo*
* Colaborou Elisangela Oliveira